Esse diploma é uma conquista, fruto de uma caminhda que tem início na adolescência e que se concretiza 35 anos depois da iniciação, neste gênero do batuque.
O tempo da capoeira e na capoeira é uma variável que se aplica a cada iniciado de forma diferente e singular. Independente do tempo de cada um, o campo de experiência e vivência é que vai determinar o seu cargo, a sua graduação e ancestralidade. Por isso a capoeira é uma filosofia transformadora.
Desde muito cedo, ainda na primeira década de minhas pernadas nas ruas de terras da Rua do Senhor Bom Jesus no Bairro Boa Vista em Campinas, tive o primeiro contato com um movimento que impactaria a minha percepção e concepção de vida nos anos que se seguiriam. Esse movimento foi a capoeira, apresentada a mim por meio de uma exibição naquelas festas juninas marcantes na Escola Dr João Alves, em meados dos anos 80.
Depois dalí, o contato foi se desenrolando timidamente. Primeiro na academia de capoeira Berimbau de Mestre Mauro, no centro da cidade de Campinas. Depois no salão comunitário do Parque Santa Bárbara desta vez de forma mais intensa como aluno de Mestre Irandir (In Memorian) no coletivo Arte Brasileira. E mais tarde como aluno de Mestre Cícero do Coletivo Capoeira de Valor que tem me orientado desde 1995. A capoeira passa então a compor meu acervo de memórias, e se constitui em um itinerário cotidiano até esse momento.
Esses eventos ocorreram nos anos 80, cuja atmosfera era de efervescência política e cultural no Brasil. Fim do violento regime militar, diretas Já, discussão política no sindicato dos metalúrgicos de Campinas e a promulgação da Constituição Federal em 1988. Esses acontecimentos influíram na construção de minhas memórias afetivas, a exemplo do exercicio da capoeira.
Por essa e outras razões, esses movimentos coletivos impactaram e determinaram parte da minha trajetória, de modo que a conquista do diploma de professor de capoeira se constituiu na experiencia mais importante e relevante da minha vida. Foram, e ainda são muitas as lições e aprendizados.
A exigência para a titulação e reconhecimento de professor de capoeira é diferente, completamente diferente daquela da faculdade em que se exige quatro anos de participação e estudos. Já o tempo exigível para a prática do professorado da capoeira ultrapassa ao das universidades. A carga horária é elevadíssima, a metodologia é mais complexa e as disciplinas oferecidas são mais amplas. Nem mesmo um curso de mestrado ou doutorado exige o tempo que a docência para a capoeira exige.
Na capoeiragem, os critérios para a obtenção de graduação são plurais e subversivos à normas pedagógicas de uma escola ou universidade. Na capoeira são extraordinariamente outros saberes, esses possuem suas particularidades e contradições, inerentes as das relações humanas.
Estudo a capoeira desde a adolescência, por isso uma titulação nesse campo de saber é tão importante, porque se premia, se reconhece e se legitíma um período da experiência de vida, que se constrói na coletividade e de forma comunitária.
O aprendizado e a prática da capoeira é um processo contínuo e permanente. Somos alunos do tempo, por isso o saber do batuque da capoeira é ancestral, tradicional. O reconhecimento de professor de capoeira, de verdade, é importante quão importante é também quem o concedeu, o mestre do batuque.
Nesse sentido, uma menção aos mestres do batuque de Campinas, Cícero, Mauro e Irandir (In Memorian) juntos escrevemos e cantamos a capoeira que meu corpo e mente habita, que me ensina e educa, e que me molda cotidianamente. Saravá aos velhos mestres. Saravá aos mestres e mestras da capoeiragem.
 
		

