O princípio da independência
Alguém aceita a ideia de ser julgado por um juizn que não seja imnparcial? O jornalista dá ou nega espaço a alguém? É sua tarefa gerenciar quem aparecerá e quem permanecerá calado? Ou cada um se “agenda” pelo que faz, diz e representa? Antes da internet possivelmente os jornalistas tivessem mais poder de dar ou negar visibilidade. Agora, podem ser menos visíveis do que muitas celebridades virtuais. Mas a questão é: cabe ao jornalista determinar quem fala e quem não fala? Uma regra clássica do jornalismo diz que todos os lados devem ser ouvidos: ponto e contraponto. Há limites para isso? Certamente. O estuprador não precisa falar na mídia. Tem, porém, direito de defesa na justiça.
Houve uma época em que o horizonte do jornalista era a isenção. Hoje, o “isentão” é criticado. Quem deve ocupar o seu lugar: o jornalista militante? O engajado? Isso não leva ao tendencioso? Tenho para mim que o jornalista deve ser independente. Critica, elogia, ataca ou defende conforme a sua consciência, as suas informações e as situações concretas. No episódio do assassinato do negro George Floyd por um policial branco, assume posição e combate o racismo. No caso da possível intervenção de Jair Bolsonaro na Polícia Federal, não hesita: Sérgio Moro apresentou a prova ao divulgar a conversa por aplicativo em que o presidente dizia, depois de uma notícia sobre investigação de deputados do PSL pela PF, “mais uma razão para mudar” o diretor-geral da instituição, Maurício Valeixo. Já quando se trata do inquérito das fake news disparado pelo STF e distribuído ao ministro Alexandre de Moraes sem sorteio, com base em interpretação elástica do regimente do interno do Supremo Tribunal Federal, crava: não tem base legal. O STF forçou a barra por omissão do Ministério Público.
Os fatos descobertos, porém, são graves, deveriam ser investigados, denunciados pelo Ministério Público e julgados. O jornalista agrada e desagrada o tempo todo. Não tem compromisso com uma ideologia, com um partido, com uma corrente política ou facção. Erra ou acerta de acordo com o que coleta, apura ou toma conhecimento. Se alguém tendo algum tipo de representatividade ou de possibilidade de impacto se torna protagonista de algo importante, como a defesa da democracia ou a sustentação de um golpe, conquista espaço por si. Ouvir quem fala o que pensamos, ou com o qual concordamos, é muito fácil. Gay Talese, mito do Novo Jornalismo agora já velho e quase esquecido, destaca que fundamental é saber ouvir aquele de quem discordamos.
Que jornalista teria se recusado a entrevistar Bin Laden? Quem rejeitaria uma exclusiva com Pinochet, Fidel Castro, Hugo Chávez, Médici, Kim Jong-un, Stálin ou Hitler? A questão evidentemente passa a ser como se daria a entrevista, o que seria perguntado e qual seria a postura do entrevistador. Para ser firme, em geral, não é necessário transformar a entrevista num interrogatório policial truculento. Algumas vezes, porém, derrapa e alguém se irrita, entrevistador ou entrevistado, ou ambos. Jornalismo é uma profissão especial que exige uma disposição singular para a solidão mesmo quando se anda em grupo.
Por Carlos Machado de Assis