Cultura como estratégia para o desenvolvimento e a responsabilidade cultural no ambiente da cidade
James Carville, marqueteiro do ex-presidente norte americano Bill Clinton disse certa vez: “É a economia estúpido”. Num contraponto anos mais tarde, Ciro Gomes, ex-ministro dos governos Itamar e Lula, afirmou: “É a indústria estúpido”.
Em meio a cantilena conservadora que se espalha no Brasil há séculos, as forças culturais propõem nas ruas das cidades, nos campos, quilombos e aldeias, a seguinte assertiva: “É a cultura estúpidos”.
Se para muitos economistas, o problema estrutural da indústria vai impor ao Brasil um sufoco a cada suspiro da crise, a cultura se constitui como uma das alternativas elementares, sobretudo por se tratar de uma matriz limpa, diversificada e sustentável.
Pesquisa da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) realizada em 2014 apurou que a produção cultural injetou 126 bilhões de reais na economia, cerca 2,6 % do PIB, empregou diretamente 1 milhão e 700 mil pessoas. Persistir no debate, e em estratégias autônomas é tarefa de agentes, produtores e fazedores culturais. Romper com a miopia governante, que ainda impera na concepção de se fazer políticas públicas para o segmento é uma premissa.
A cultura é comprovadamente geradora de riqueza, é matriz para o desenvolvimento de qualquer país que nutre sobre seu território, responsabilidade. Conhecimento, tradição, memória e territorialidade constituem objetos de políticas culturais permanentes, de valorização, salvaguarda e sustentabilidade.
Não se trata porém, de reduzir a percepção de investimentos em cultura e criatividade, sob a perspectiva neoglobalizada, pura e simples, cuja subserviência é o lucro. Se trata de considerá-la como vetor capaz de estimular o surgimento de novos e inovados agentes econômicos, fortalecer os existentes, ampliar o público e a massa crítica para o universo da cultura e da arte.
Países como Colômbia, Espanha, Nova Zelândia demonstram que investimentos a longo prazo, no que se convencionou chamar de Cidades Criativas, calçado em projetos institucionalizados e com objetivos claros, resultaram como uma das principais soluções para as necessidades do indivíduo e da coletividade.
O programa Cultura Viva, que se tornou em 2014 política de Estado e o Plano Nacional de Cultura constituem parte dos avanços obtidos dentro do histórico das políticas culturais no Brasil. Conquistas que estão sob forte ameaça.
Durante a execução do Programa Cultura Viva entre os anos de 2004 a 2009 foram 8 milhões e 500 mil pessoas beneficiadas, e mais de 3 mil pontos de cultura constituídos em mais de 100 mil municípios, segundo dados do Ipea.
Além do surgimento e do fortalecimento dos movimentos sociais ligados a cultura, inaugura-se no Brasil, ao menos nesse período, uma metodologia de gestão cultural, cujo experimento de compartilhamento do poder para a gestão do recurso inflamou outros países da América Latina. Argentina, Colômbia, Costa Rica e Peru efetivaram a Cultura Viva em seus territórios. Sete países articulam as condições para a instituição do programa.
Instituído através da lei 12.343 de 2010, o Plano Nacional de Cultura compõe parte da política pública de Estado, e tem o objetivo de democratizar o acesso e a produção cultural em todo o território nacional.
Previsto na Constituição Federal nos artigos 215 e 216, o PNC contém 53 metas a serem cumpridas até 2020. Um dos pontos mais interessantes desse instrumento é a adesão dos Estados e Municípios por meio de assinatura de convênios, o que em tese, complementaria o repasse de recursos para a efetivação das políticas. Entretanto, a concepção de gestão de alguns estados e municípios, partidarizada, ainda impede o avanço dessa ferramenta.
Em termos gerais, o setor cultural na esfera municipal ainda carece de autonomia para a criação de um fonte de recurso capaz de estimular a cultura local. Ao mesmo tempo espera-se do governo federal, empenho na construção de uma política de crédito permanente, com condições de alavancar o segmento e contribuir com a tão desejada sustentabilidade.
Em que pese a falta de visão e projeto estratégico do poder público para o setor, a proposta do segmento é de retomar a Cultura Viva, fortalecer o PNC e pensar um novo modelo de gestão cultural, baseado em conceitos inovadores como o da gestão compartilhada, já experimentado através dos Pontos de Cultura e da Responsabilidade Cultural, debatido e reverberado por pensadores e fazedores culturais.
E por fim, ratificar o pressuposto da política publica. É na cidade e na comunidade, onde tudo acontece.
Excelente abordagem num momento tão complicado para o segmento. Nota-se, que o despreparo governamental para tratar o assunto, ainda é o maior entrave para o desenvolvimento.